Armagedom - Série Deixados Vol 11
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- Categoria: Literatura
- Publicado: Segunda, 29 Março 2004 00:27
- Escrito por Christian Zornoff
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Pré-Venda para 16/4/2004.
É chegado o momento para o qual todos se prepararam, a Batalha do Armagedom. As armas do mundo todo se encaminham ao Monte Megido no Vale do Armagedom no crucial momento para o qual todas as eras se convergem. Nicolae Carpathia, o Anticristo, desesperado intensifica como nunca a perseguição aos que não aceitaram sua marca e se recusaram a adorá-lo, e muitos são mortos em razão de sua fé. O Comando Tribulação sacrifica tudo nesta última batalha, há apenas algumas horas, senão minutos, antes do Glorioso Aparecimento.
Editora: United Press
ISBN: 8524303077
Ano: 2004
Edição: 1
Número de páginas: 416
Acabamento: Brochura
Formato: Médio
Coleção: DEIXADOS PARA TRÁS
Complemento da Edição: Nenhum
Os seis primeiros anos da Tribulação ficaram para trás, tem início o Armagedom, no entanto será necessário suportar ainda um ano até o Glorioso Aparecimento. Quem permanecerá firme em sua fé mesmo diante de uma captura, interrogatório ou tortura?
O Comando Tribulação, espalhado por todos os cantos da Terra, e os exércitos do mundo inteiro são atraídos inexoravelmente para o Oriente Médio no momento em que a História leva-os a reunir-se em preparação para a batalha dos séculos. Durante o último ano da Grande Tribulação, as casas secretas deixam de ser secretas e os personagens da trama mudam dramaticamente.
O anticristo dá as cartas para o jogo mais traiçoeiro do mundo, e todos são obrigados a mudar-se para outro local, exceto os que estão em Petra. Inicia-se um novo romance, um romance recente é oficializado e um romance antigo entra em crise enquanto milhões de pessoas se aglomeram para a grande guerra.
Mesmo depois de tantos preparativos, artimanhas e recursos, de que forma os membros do Comando Tribulação sobreviverão para ver o Glorioso Aparecimento? A força que eles enfrentam é tremenda. O Armagedom será semelhante às muitas batalhas da antiguidade, quando o inimigo parecia tão grande e a derrota tão iminente.
Primeiro Capítulo
Pela primeira vez desde a decolagem, Rayford Steele teve
dúvidas sobre a passageira que viajava com ele e Abdullah
Smith.
– Não devíamos ter trazido essa moça, Smitty – ele disse,
olhando de esguelha para Abdullah, que estava no comando
da aeronave.
O jordaniano sacudiu a cabeça.
– Sinto muito, capitão, mas o problema é seu. Eu tentei
lhe dizer que ela era muito importante em Petra.
A escuridão envolvendo apenas Nova Babilônia, mas
visível a uma distância de mais de 160 quilômetros, era
diferente de tudo o que Rayford já vira. No momento em que
Abdullah iniciou as manobras de pouso do Gulfstream IX em
direção ao Iraque, o relógio marcava 12 horas, horário do
palácio.
Normalmente, as magníficas estruturas da capital do novo
mundo reluziam de maneira deslumbrante ao sol do meiodia.
Agora, apenas uma impressionante e solitária coluna
negra erguia-se nas imensas fronteiras de Nova Babilônia e
subia em direção ao céu sem nuvens, até a uma altura que
os olhos conseguiam enxergar.
Chang Wong era o espião de Rayford dentro do palácio.
Confiando nas informações do jovem de que eles seriam
capazes de enxergar o que outros não conseguiriam, Rayford
trocou um olhar com Abdullah, o co-piloto que conduzia
a aeronave na escuridão, baseando-se apenas na brancura
refletida pela areia do deserto. Abdullah acendeu as luzes de
pouso.
Rayford olhou para ele de esguelha. – Vamos precisar de
ILS?
– Sistema de pouso por instrumentos? – disse Abdullah.
– Acho que não, capitão. Estou enxergando o suficiente.
Rayford comparou a terrível escuridão com o dia lindo
que eles passaram em Petra. Olhou para a jovem por cima do
ombro, imaginando ver medo em seu semblante. Ela estava
tranqüila.
– Ainda temos possibilidade de voltar – Rayford disse a
ela. – Seu pai parecia relutante quando você subiu a bordo.
– Talvez por não querer causar problemas para o senhor
– disse Naomi Tiberias. – Ele sabe que vou ficar bem.
O humor e a autoconfiança daquela adolescente perita em
informática eram excelentes. Ela pareceu tímida e retraída
na presença dos dois adultos até o momento de conhecêlos
melhor; depois, passou a conversar de igual para igual.
Rayford sabia que ela ensinara Abdullah a ser um profundo
conhecedor dos assuntos de informática e que manteve
contato constante com Chang desde que a escuridão tomou
conta de Nova Babilônia.
– Por que está escuro somente aqui? – Naomi perguntou.
– É muito estranho.
– Não sei – respondeu Rayford. – A profecia diz que ela
afetaria o trono da besta e que seu reino se transformaria em
trevas. É só isso que eu sei.
A cada visita a Petra, Rayford presenciara a crescente
influência e responsabilidade de Naomi perante os remanescentes.
Por ter se sobressaído como um prodígio em tecnologia,
Naomi tornou-se chefe de fato e de direito do imenso
centro de informática de Petra. Passando rapidamente de
subordinada a chefe, ela se tornou professora dos outros professores.
O centro de tecnologia que havia sido projetado pelo
falecido David Hassid, o antecessor de Chang, era agora o
ponto nevrálgico que mantinha Petra em contato com mais de
um bilhão de almas todos os dias. Milhares de computadores
permitiam que muitos mentores acompanhassem o público
virtual de Tsion Ben-Judá. Naomi coordenava pessoalmente o
contato entre Chang, em Nova Babilônia, e o Comando Tribulação
ao redor do mundo.
A idéia de incluí-la no vôo que resgataria Chang em Nova
Babilônia partira dele próprio. A princípio, Rayford não concordou.
Já havia assumido responsabilidade suficiente quando
viajou mais de 12 mil quilômetros de San Diego a Petra, onde
pegou Abdullah para ser seu co-piloto durante os últimos 800
quilômetros até Nova Babilônia. George Sebastian, o piloto
especialista em aeronaves de combate, teria sido melhor
escolha, mas Rayford sabia que o grandalhão passara por
maus bocados recentemente. Havia muito trabalho para ele
em San Diego, e Rayford queria poupar George para o evento
ao qual o Dr. Ben-Judá dava o nome de “a batalha do grande
dia do Deus Todo-Poderoso”, que ocorreria antes de um ano.
Mac McCullum e Albie estavam em Al Basrah, cidade
localizada cerca de 300 quilômetros ao sul de Nova Babilônia,
aguardando ordens. Mas Rayford tinha outros planos para
eles.
O genro e a filha de Rayford – Buck e Chloe Williams
– prontificaram-se a tirar Chang da toca do inimigo, o que
não era surpresa alguma, porém Rayford estava convencido
de que, em breve, Buck seria mais útil em Israel. Quanto
a Chloe, a Cooperativa Internacional de Mercadorias havia
sentido sua falta quando ela esteve ausente por uns tempos.
E alguém teria de cuidar do pequeno Kenny.
– Pegue todos os equipamentos de que você necessita
enquanto estivermos a caminho, Chang – Rayford dissera,
com o telefone encaixado entre o ombro e ouvido enquanto
arrumava a mala. – Smitty e eu chegaremos aí dentro de dois
dias.
Chang explicara que a missão era complicada demais e
que ele e Naomi, trabalhando juntos, poderiam tirá-lo de
Nova Babilônia muito mais rápido.
– Eu não quero deixar nada para trás – ele dissera. – Ela
pode ajudar. Quero ter condições de monitorar este palácio
de qualquer lugar do mundo.
– Não se preocupe – disse Rayford. – Logo você estará
frente a frente com ela.
– Não sei do que o senhor está falando.
– O pai dela é um dos anciãos de Petra, você sabe.
– E daí?
– Só restaram os dois na família. Ele a protege muito.
– Ela e eu temos muito trabalho a fazer.
– Entendo.
– Não estou brincando, capitão Steele. Por favor, ela precisa
vir com o senhor. Eu já vi o rosto dela na tela.
– E então, o que você achou dela?
– Eu já lhe disse. Temos muito trabalho a fazer.
_____________
Rayford sentiu um cutucão no espaldar de sua poltrona
quando Naomi esticou o corpo para a frente.
– O Sr. Smith tem condições de pousar? – ela perguntou.
– Ele está enxergando bem?
– Não sei – respondeu Rayford. – Parece que alguém
pintou as janelas da aeronave de marrom. Procure entrar em
contato com nosso garoto.
A missão de Chang era confirmar se as pistas de Nova
Babilônia estavam em condições, mas ele não podia dizer
isso por telefone, com medo de que alguém escutasse. Naomi
tirou um computador pequeno de dentro de uma caixa de
alumínio, e seus dedos começaram a correr pelo teclado.
– Evitem pista três esquerda e três direita – ela disse. – E
Chang quer saber que pista será escolhida para poder estar lá
quando pousarmos.
Rayford olhou de relance para Abdullah e dirigiu-se à
jovem.
– Ele está falando sério, Naomi?
Ela assentiu com a cabeça.
– Diga a ele que a torre está fechada e que não vamos
comunicar nossa chegada. Daqui, não podemos distinguir as
pistas, portanto ele vai ter de nos dar as coordenadas e...
– Um momento – disse Naomi, digitando mais algumas
palavras. – Ele incluiu em um anexo tudo o que o senhor
necessita. – Naomi virou a tela em direção a Rayford e apontou
para o anexo. – O sistema de voz está ativado. Diga a ele
o que o senhor quiser.
– O aparelho vai reconhecer minha voz? – perguntou
Rayford, examinando a tela.
– Sim – respondeu o computador.
Naomi riu.
– Anexo, por favor – disse Rayford.
Uma imagem detalhada apareceu na tela exibindo a vista
aérea do aeroporto de Nova Babilônia.
– Vou acertar as coordenadas para você, Smitty – disse
Rayford, procurando programar o sistema de controle de
vôo.
– Esta coisa faz tudo. Só não é capaz de preparar comida
para o senhor, capitão Steele – disse Naomi. – O senhor tem
uma saída de raio infravermelho?
– Acho que sim. Temos, Smitty?
Abdullah apontou para um botão no painel de controle.
– Aqui – disse Naomi. – Deixe por minha conta. – Ela
debruçou o corpo por cima do ombro de Rayford e apontou
a parte traseira do computador na direção da saída. – Pronto
para aterrissar, capitão?
– Positivo.
– Iniciar manobras de pouso – ela disse, apertando um
botão.
– Em qual pista? – perguntou o computador.
Naomi olhou para Rayford, que, por sua vez, olhou para
Abdullah.
– Será que essa coisa reconhece tudo, até meu sotaque?
– perguntou o jordaniano.
– Sim – disse o computador. – Pista três esquerda e pista
três direita congestionadas. Escolha pistas 11 ou 16.
– Onze – disse Abdullah.
– Esquerda ou direita? – perguntou o computador.
– Esquerda – respondeu Abdullah. – Por que não?
Abdullah acionou o piloto automático para a esquerda e
tirou as mãos dos controles.
– Obrigado – ele disse.
– De nada – respondeu o computador.
Seis minutos depois, o Gulfstream pousou na pista.
_____________
Pouco depois de uma hora da madrugada em San Diego,
Buck deu um salto na cama.
Chloe se mexeu.
– Volte a dormir, querido – ela disse. – Você ficou vigiando
três noites seguidas. Hoje não.
Ele levantou a mão.
– Você precisa dormir, Buck.
– Acho que ouvi alguma coisa.
O pequeno walkie-talkie na mesinha de cabeceira vibrou.
Sebastian acionou seu código. Buck agarrou o aparelho.
– Sim, George.
– Sinais no detector de movimento – Sebastian sussurrou.
Chloe sentou-se na cama.
– Vou verificar pelo periscópio – disse Buck.
– Tome cuidado – alertou Sebastian. – Não levante nem
gire o aparelho.
– Entendido. Alguém mais sabe disto?
– Negativo.
– Mãos à obra.
Chloe já havia se levantado e vestido um agasalho. Ela
abriu um armário, retirou duas Uzis e jogou uma para Buck,
que se dirigiu para o periscópio ao lado do minúsculo quarto
de Kenny. Ele colocou a arma no chão, guardou o walkietalkie
no bolso do pijama e curvou-se para enxergar no visor.
Enquanto seus olhos se acostumavam à escuridão, ele notou
que Chloe abriu e fechou a porta do quarto de Kenny. O
garoto estava prestes a completar quatro anos; dormia bem,
mas o sono era menos profundo que antes.
– Ele está dormindo? – perguntou Buck, sem desgrudar os
olhos do periscópio.
– Como um anjo – respondeu Chloe, colocando uma
malha de lã ao redor dos ombros de Buck. – É o que você
devia estar fazendo.
– Quem me dera – disse Buck.
– Também acho. – Ela pousou as mãos abertas nos
ombros do marido. – O que você está vendo?
– Nada. George acha que não devo girar o aparelho. Ele
está apontando para o oeste, no nível do chão. Eu adoraria
levantá-lo uns 15 centímetros, o que me daria um ângulo de
visão de 36º.
– Ele está certo, meu bem – ela disse. – Você sabe que
esse aparelho faz barulho quando é movimentado. Alguém lá
fora poderá ouvir.
– Não acho que haja alguém lá fora – disse Buck, afastando-
se do aparelho para coçar os olhos.
Ela deu um longo suspiro. – Quer uma cadeira?
Buck assentiu com a cabeça e voltou a olhar pelo
periscópio. – Pode ter sido um animal. Talvez o vento.
Chloe colocou uma cadeira atrás de Buck e o fez sentar-se.
– É por isso que você devia ter permitido que eu...
– Oh!, não – ele disse.
– O que foi?
Buck colocou o dedo indicador diante dos lábios e pegou
o walkie-talkie.
– George – ele sussurrou. – Seis, sete, oito, nove. Nove
homens da CG, fardados e armados, na direção oeste.
– Fazendo o quê?
– Nada de importante. Chutando as aberturas de ventilação.
Parecem entediados. Talvez tenham visto alguma coisa
no caminho.
– Veículos?
– Eu teria de levantar e girar o periscópio.
– Negativo. Há mais alguns?
– Deste ângulo, não sei dizer. Não passou mais ninguém.
Agora só estou vendo três.
– Você está ouvindo ronco de motores?
Buck ficou em silêncio por alguns instantes. Em seguida,
respondeu:
– Sim, ouvi um. Depois outro.
– Também estou ouvindo – disse George. – Devem estar
indo embora. Posso ir até aí?
– Diga a ele que não – sussurrou Chloe.
_____________
Ao olhar para a lúgubre paisagem em tonalidade sépia
através da janela da cabina de comando, Rayford imaginou
que o pessoal do palácio deveria estar sofrendo muito. Chang
lhe contara que o povo se contorcia e gemia, mas o zumbido
de um jato na pista os assustaria ainda mais. Eles pensariam
que teria havido um acidente aéreo, como aconteceu antes
nas pistas três esquerda e três direita.
Parecia que o povo desistira de tentar enxergar. As pessoas
próximas ao Gulfstream IX tropeçaram na escuridão
para afastar-se dele e agora estavam aglomeradas aqui e ali.
– Aquele deve ser Chang – disse Rayford, apontando para
um asiático correndo na direção deles e gesticulando nervosamente
para que abrissem a porta.
– Deixe por minha conta, Srta. Naomi – disse Abdullah,
desatando o cinto de segurança e pulando por cima dela.
Assim que Abdullah abriu a porta e abaixou a escada,
Rayford viu Chang virar-se para um pequeno grupo de
homens e mulheres que tateavam no escuro, procurando
segui-lo.
– Afastem-se! – ele gritou. – Perigo! Motores quentes!
Combustível vazando!
Eles se viraram e correram em todas as direções.
– Como ele conseguiu pousar? – gritou alguém.
– Milagre – disse outro.
– Vocês se lembraram de usar sapatos de sola de borracha?
– perguntou Chang, estendendo a mão para ajudá-los a
sair do avião.
– Prazer em conhecê-lo, Sr. Wong – disse Abdullah.
Chang pediu silêncio. – Eles não estão enxergando, mas
não são surdos.
– Chang – Rayford começou a dizer, mas o rapaz estava
cumprimentando timidamente Naomi. – Tudo bem. Vocês
dois terão tempo para se conhecerem melhor. Vamos fazer o
que for necessário e sair daqui.
_____________
– Devo trocar de roupa? – perguntou Buck quando viu
Sebastian trajando farda de serviço.
– Não. Eu sempre uso esta farda quando estou de vigia.
Deixe-me ver o que está acontecendo. – Ele olhou através
do periscópio. – Nada. Vamos levantar e girar o periscópio,
Buck?
– Faça como quiser.
– Tudo em ordem. Alarme falso.
Chloe respirou fundo. – Não diga isso só para me tranqüilizar.
Vocês viram pelo menos nove homens da CG lá
fora, e sabemos que havia mais. E eles vão voltar.
– Ei – disse Sebastian –, por que não pensar no melhor
em vez de pensar no pior?
– Talvez eu esteja fazendo isso – ela disse. – Priscilla e
Beth Ann estão dormindo tranqüilas?
Ele assentiu com a cabeça. – Não quero alarmar Priss e
gostaria que você...
– Que eu não dissesse nada? Faz sentido, George. Deixe
sua mulher em paz, ignorando que é chegada a hora de sairmos
daqui – disse Chloe.
– Sair daqui? – perguntou Buck. – Eu não imaginei essa
hipótese.
– O que você acha? Devemos ficar aqui e aguardar até
que eles nos encontrem, se é que ainda não nos encontraram?
– Chloe, preste atenção – disse Buck. – Eu deveria ter
permitido que você visse aqueles sujeitos. Eles não descon-
fiaram de nada. Deviam estar conversando sobre este lugar
que, antes, foi uma base militar. Não estavam tensos, não
estavam à procura de nada. Apenas notaram as aberturas de
ventilação e foram verificar, só isso.
Chloe sacudiu a cabeça e desabou em uma cadeira.
– Detesto viver desta maneira.
– Eu também – disse Sebastian. – Mas quais são nossas
opções? A CG encontrou ontem em Los Angeles, ou melhor,
no que restou daquela cidade, um grupo de pessoas sem a
marca. Mais de 20 foram executadas.
Chloe estremeceu. – Crentes?
– Acho que não. Se fosse um grupo de judaístas, eles
teriam noticiado. Tenho a impressão de que pertenciam a um
foco de resistência da milícia ou algo parecido.
– É essa gente que estamos querendo alcançar – disse
Chloe. – E estamos todos sentados aqui, sem poder mostrar
o rosto, criando bebês que quase não vêem a luz do sol.
Será que não existe outro esconderijo em um lugar qualquer,
onde a CG nem imagine nos encontrar?
– O melhor lugar é Petra – disse Buck. – A CG sabe quem
está lá, mas não pode fazer nada.
– Esse lugar está ficando cada vez mais atraente. Mas... o
que vamos fazer a respeito do que acabou de acontecer?
Buck e Sebastian entreolharam-se.
– Vamos, rapazes – disse Chloe. – George, você pensa
que Priscilla não notou que você saiu e que não vai perguntar
onde esteve?
– Ela sabe que eu estava no posto de vigia.
– Mas você não viria até aqui, a menos que houvesse algo
importante.
– Espero que ela não tenha acordado.
Chloe levantou-se e sentou-se no colo de Buck. – Vejam,
eu não quero ser rabugenta. Buck, diga isso a ele.
– Chloe Steele Williams está dizendo que não quer ser
rabugenta – ele anunciou.
– Que bom – resmungou Sebastian. – Você quase me
enganou, Chloe.
Ela sacudiu a cabeça. – Por favor, George. Você sabe
que eu o considero um elemento muito importante para o
Comando Tribulação. Você é muito talentoso e nos livrou de
tragédias mais de uma vez. Mas todos que moram aqui têm
o direito de saber o que vocês viram esta noite. O fato de não
contar nada a ninguém, fingir que nada aconteceu, não vai
mudar a situação. Quase fomos descobertos.
– Mas não fomos, Chloe – disse Sebastian. – Por que
assustar todo mundo?
– Já estamos assustados! Passo o dia inteiro com essas
mulheres e seus filhos. Estamos vivendo como cães abandonados,
mesmo sem ter a CG bisbilhotando por aqui e
transitando acima de nós no meio da noite. As crianças só
respiram ar puro quando acordam antes do nascer do sol
e alguém as leva até a porta de acesso ao estacionamento.
Vocês dois precisam sair furtivamente e dirigir cerca de 50
quilômetros para chegar aos aviões, sempre na esperança
de não estar sendo seguidos. Só estou dizendo que se não
resolvermos nos defender, pelo menos temos o direito de
estar preparados.
_____________
Rayford teria de fazer uma pergunta a Tsion. Por que a
escuridão era tão opressiva a ponto de deixar suas vítimas
angustiadas? Ele ouvira falar de tragédias – desastres ferroviários,
terremotos, batalhas – que sempre deixavam as
equipes de resgate assustadas por causa dos gritos e gemidos
dos feridos. Enquanto ele, Abdullah, Chang e Naomi atravessavam
na ponta dos pés as enormes pistas do aeroporto,
desviando-se de equipamentos pesados e de gente se contorcendo,
ficou claro que aquelas pessoas preferiam morrer. E
algumas já deviam estar mortas. Dois aviões que se chocaram
no ar estavam despedaçados na pista, ainda em chamas, com
muitos corpos carbonizados presos às poltronas.
Rayford sentia um aperto no peito à medida que passava
por entre cadáveres e pessoas sofrendo. Os gemidos cortavam-
lhe o coração e ele reduziu o ritmo dos passos, querendo
ajudar. Mas o que poderia fazer?
– Oh! Alguém! – Era o grito de uma senhora de meiaidade.
– Por favor! Ajude-me!
Rayford parou e olhou. Ela estava deitada de lado no
chão, perto do terminal. Algumas pessoas ordenaram-lhe que
se calasse. Um homem gritou:
– Estamos todos perdidos e cegos, mulher! Você não precisa
de mais ajuda que nós!
- Vou morrer de fome! – ela choramingou. – Alguém tem
alguma coisa para eu comer?
– Estamos todos morrendo de fome! Cale a boca!
– Eu não quero morrer.
– Eu quero!
– Onde está o potentado? Ele vai nos salvar!
– Quando você viu o potentado pela última vez? Ele já
tem preocupações suficientes.
Rayford não conseguia afastar-se dali. Olhou para a
frente, mas ele enxergava apenas uns seis metros adiante e
havia perdido seus companheiros de vista. Abullah foi a seu
encontro.
– Eu não me atrevi a chamá-lo pelo nome, capitão, mas
você precisa vir conosco.
– Não posso, companheiro.
– Você é capaz de encontrar o caminho de volta ao avião?
– Sim.
– Então vamos nos encontrar lá.
Abdullah seguiu em frente, mas a conversa sussurrada
entre eles provocara um silêncio entre os gritos e lamentos.
Alguém gritou:
– Quem está aí?
– Para onde ele foi?
– Quem tem um avião?
– Você está vendo alguma coisa?
– O que está vendo?
A mulher voltou a falar.
– Oh!, Deus, salva-me. Quero dormir...
– Você aí, cale a boca!
– Deus é grande. Deus é bom. Vou agradecer a Ele...
– Pare de falar, mulher! Se você não é capaz de fazer
alguma coisa útil, cale a boca!
– Deus! Oh, Deus! Salva-me!
Rayford ajoelhou-se e tocou no ombro da mulher. Ela
recuou com um berro.
– Espere! – ele disse, tocando-a novamente.
– Ai! Está doendo!
– Eu não quis machucá-la – ele disse em voz baixa.
– Quem é você? – ela disse com um gemido. Rayford viu
o número 6 dos Estados Unidos Europeus gravado em sua
testa. – Um anjo?
– Não.
– Eu orei pedindo um anjo.
– A senhora orou?
– Prometa que não vai dizer a ninguém. Eu lhe imploro.
– A senhora orou a Deus?
– Sim!
– Mas eu vi a marca de Carpathia em sua testa.
– Eu falsifiquei a marca! Conheço a verdade. Sempre conheci.
Mas nunca quis saber de nada.
– Deus a ama.
– Eu sei, mas é tarde demais.
– Por que a senhora não pediu perdão a Deus e aceitou
sua dádiva? Ele queria salvá-la.
Ela soluçou baixinho.
– Como você pode estar aqui e me dizer isso?
– Eu não sou daqui.
– Você é meu anjo!
– Não, mas sou crente.
– E consegue enxergar?
– O suficiente para me locomover.
– Oh, cavalheiro, estou com fome! Leve-me ao terminal,
até a máquina de sanduíches. Por favor!
Rayford procurou ajudá-la a levantar-se, mas ela reagiu
como se seu corpo estivesse em chamas.
– Por favor, não me toque!
– Sinto muito.
– Deixe que eu segure a manga de sua camisa. Você está
vendo o terminal?
– Mais ou menos – ele disse. – Posso levá-la até lá.
– Por favor. – A mulher levantou-se com dificuldade e
agarrou desajeitadamente o punho da camisa dele com o
polegar e o indicador. – Devagar, por favor. – Ela caminhava
com passos miúdos atrás de Rayford. – Está longe?
– Pouco menos de cem metros.
– Não sei se vou conseguir – ela disse, com lágrimas correndo
pelo rosto.
– Vou buscar alguma coisa para a senhora comer – ele
disse. – O que a senhora quer?
– Qualquer coisa – ela respondeu. – Sanduíche, doce,
água... qualquer coisa.
– Não saia daqui.
Ela deu uma risadinha triste. – Não estou enxergando
nada. Não posso ir a lugar algum.
– Eu volto logo. Vou encontrar a senhora.
– Eu orei para que Deus salvasse minha alma. E quando
isso acontecer, vou poder enxergar.
Rayford não sabia o que dizer. Ela já havia dito que era
tarde demais.
– Deus amou muito o mundo – ela prosseguiu. – O
Senhor é o meu pastor. Oh!, Deus...
Rayford correu em direção ao terminal, passando por
entre pessoas angustiadas. Ele queria ajudar todas, mas não
podia. Havia um homem deitado, imóvel, do lado de dentro
da porta automática, impedindo a passagem. Rayford aproximou-
se o suficiente para acionar o sensor. A porta abriu
alguns centímetros e foi de encontro ao homem.
– Por favor, afaste-se da porta – disse Rayford.
O homem estava dormindo ou morto.
Rayford empurrou a porta com força, mas ela mal se
movimentou. Ele abaixou o ombro e investiu contra a porta,
sentindo a pressão nos quadris quando ela se abriu lentamente
e empurrou o homem. Rayford ouviu-o gemer.
Dentro do terminal havia uma fileira de máquinas
automáticas, mas assim que ele pegou algumas moedas no
bolso, viu que elas estavam emperradas. Muitas pessoas que
conseguiram chegar até ali haviam arrombado as máquinas
e saqueado tudo o que havia dentro. Rayford vasculhou uma
a uma, procurando encontrar alguma coisa, qualquer coisa
que tivesse sobrado ali. Mas só encontrou garrafas, latas e
pacotes vazios.
– Quem entrou lá? – alguém quis saber. – Aonde você
pensa que vai? Consegue enxergar? Há luz em algum lugar? O
que aconteceu? Vamos todos morrer? Onde está o potentado?
Rayford correu para fora.
– Aonde você está indo? – gritou outro. – Leve-me com
você!
Ele encontrou a mulher deitada de bruços, com o rosto
escondido entre os braços. Seu choro era tão sofrido que ele
mal suportou olhar para ela.
– Estou de volta, senhora – ele disse em voz baixa. – Não
há comida. Sinto muito.
– Oh, Deus, oh, Deus e Jesus, ajuda-me!
– Senhora – ele disse, estendendo o braço.
Ela soltou um grito quando Rayford a tocou, mas ele a
virou de lado até poder ver seus olhos fundos e aterrorizados.
– Eu sabia de tudo antes dos desaparecimentos – ela disse,
com voz chorosa. – Depois, tive certeza. Mesmo com todas
essas pragas e julgamentos, eu afrontei Deus. Ele procurou
me alcançar, mas eu queria viver por conta própria. Não
queria submeter-me a ninguém. Mas sempre tive medo do
escuro, e meu maior pesadelo é morrer de fome. Mudei de
idéia, quero voltar atrás...
– A senhora não pode.
– Eu não posso! Não posso! Esperei demais!
Rayford conhecia a profecia: o povo rejeitaria Deus tantas
vezes que Ele endureceria seus corações e eles não teriam
condições de aceitá-lo, mesmo que quisessem. Mas o fato de
saber disso não significava que Rayford entendia. E, certamente,
não significava que ele tinha de gostar. Era difícil
conciliar tudo aquilo com o Deus que ele conhecia, o Deus
amoroso e misericordioso que parecia fazer uso de todos os
meios para receber cada pessoa no céu, sem deixar nenhuma
de fora.
Rayford levantou-se e sentiu o sangue fugir-lhe da cabeça
no momento em que ouviu uma voz partindo dos alto-falantes.
– Aqui fala o potentado! – soou a voz forte. – Tenham
bom ânimo. Não fiquem com medo. Seu tormento está
quase no fim. Acompanhem o som de minha voz até a torre
de alto-falantes mais próxima. Lá, haverá comida, água e
instruções.
_____________
– Quero fazer um trato com vocês – disse Chloe. – Vou
assumir o posto de vigia se vocês concordarem em contar a
todos, assim que o dia amanhecer, que tivemos visitas esta
noite.
Buck olhou para George, e George apontou para Buck.
– Na ausência de seu sogro, você é o responsável, companheiro.
– Só porque sou o mais velho de vocês. Transfiro a
missão a você que é militar.
– Não estamos em guerra, homem. O assunto tem a ver
com relações públicas. Se você aceita um conselho, faça o
que deseja fazer, desde que seja a coisa certa. Diga ao pessoal:
“Achamos por bem contar a vocês que vimos a CG
rondando por aqui esta noite, mas, pelo que sabemos, ainda
não há motivos para preocupações.”
– Tudo bem, Chloe? – Buck perguntou.
Ela assentiu com a cabeça. – Eu preferia orar e entregar
munições ao pessoal, mas minha resposta é sim. Tratem
todos como adultos e vocês extrairão o que eles têm de
melhor.
– Se você vai mesmo ocupar o posto de vigia, Chloe
– disse Sebastian –, vou para casa e desligar meu walkietalkie.
– Combinado.